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Um clube nos Esports!
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O Estoril Praia E-sports é o primeiro clube a estar representado na Moche LPLOL! Fomos até ao clube para falarmos com o João “Soka” Paulo e o João “Litrosa” Pinto, dois dos fundadores do projeto.

João Paulo, como apareceu esta ideia?
Soka: Foi uma ideia conjunta de três amigos, que tomaram a iniciativa de abordar o Estoril Praia para criar a modalidade de esports no clube.

Falem-nos um pouco do processo de criação da modalidade de esports no Estoril Praia.
Soka: Anteriormente já detínhamos uma organização amadora, os Minotaurs on Steroids, e a certa altura decidimos tentar expor o desafio de um projeto conjunto a um clube de futebol. Como na altura só o Sporting Clube de Portugal estava a investir em esports no nosso país, decidimos tentar a nossa sorte e conseguimos.

E na altura qual foi a recetividade à ideia?
Soka: Para terem noção, já me perguntaram se desporto eletrónico é desporto. Ou seja, a mentalidade de algumas pessoas no que toca ao desporto ainda está apenas focada no futebol, no ténis, etc. Para essas pessoas tudo pode ser desporto menos esports e também não mostram interesse em ir pesquisar sobre o que se trata.

Temos assistido à entrada de várias organizações e clubes desportivos nesta área dos esports… Nesse sentido, qual é a relação que existe entre a direção do Estoril Praia, e a equipa que coordena a secção de esports?
Litrosa: Há que ter em atenção que nós não estamos associados diretamente à SAD do Estoril Praia. A SAD é apenas futebol. Nós fazemos parte do Grupo Desportivo Estoril Praia, que é a associação sem fins lucrativos do mesmo, e que tem cerca de 15 a 17 modalidades. A relação entre estas é bastante boa, tanto com o manager das várias modalidades, o senhor João Rocha, como com o Presidente Alexandre Faria, que foi a quem fizemos a apresentação do projeto, e foi ele que aceitou o Estoril Praia E-sports como modalidade no grupo. A relação é quase como a relação de uma família, porque o Estoril é um clube de futebol de primeira divisão, mas não é tão grande como o Sporting ou o Benfica. Tudo o que aqui é feito, é através de bastante esforço e suor, tanto que todos eles têm trabalhos paralelos, que levam como carreiras profissionais. O que aqui se faz é sobretudo por amor à camisola!

E no que toca ao financiamento da secção de esports do Estoril Praia, há algum respaldo por parte do clube, ou é semelhante ao modelo do Sporting Clube de Portugal eSports, no qual esta secção é somente sustentada pelos patrocinadores?
Soka: É semelhante à do SCP eSports. Da parte do clube apenas temos o símbolo e o nome, o que já é muito importante. Estamos a usar o nome de um grande clube que nos deu esta oportunidade.

Claro que associada a essa utilização do símbolo e nome advêm algumas responsabilidades… Ficaram explícitos algum tipo de requisitos ou objetivos?
Litrosa: As regras foram bem explicadas no início e os responsáveis do clube ajudam-nos cada vez mais. Encontram-nos maneiras de angariar fundos, sendo por donativos ou por patrocínios nos campos de treino. Cada vez estão mais abertos à ideia de que somos realmente uma modalidade a ter em atenção, e que podemos ter sucesso, e vão-nos facultando estas ferramentas para angariar mais capital para a nossa modalidade.

Quando se é pioneiro há sempre que desbravar caminho…
Soka: Sim, e em Portugal os esports ainda são um tabu para muitas pessoas.
Litrosa: Eu até diria que por representarmos o Estoril Praia estamos algo “handicapped” no que toca a fazer contratos e parcerias, pois há uma data de regras que são necessárias por se tratar de marca registada e de uma associação sem fins lucrativos. Por exemplo, se uma marca de bebidas energéticas quiser dar-nos dinheiro para a nossa modalidade, colocando o seu logo nos nossos equipamentos, no “overlay” das nossas streams, etc, em contrapartida, tal não é possível. Uma associação sem fins lucrativos não pode aceitar esse tipo de contratos. Tem de ser feito através de donativos, mas através de donativos é impossível passar fatura como uma associação sem fins lucrativos… Neste campo, representar um clube de futebol torna tudo mais complicado do que se fossemos uma entidade unipessoal, que é algo que temos em mente para encontrar uma solução. Nesse sentido temos falado com os dirigentes do grupo desportivo, pois eles próprios também têm interesse em resolver esta questão. É muito difícil de justificar a alçada de uma organização destas perante outras entidades. Já nos foram oferecidos vários patrocínios, mas devido à nossa situação não nos foi possível aceitar tais ofertas.

Para uma marca ou empresa que esteja interessada, qual é a forma mais simples de apoiar, ou patrocinar, o Estoril Praia E-sports?
Soka: Depende da empresa. Não podem ser empresas que representem uma concorrência direta às empresas que atualmente patrocinam o Estoril Praia. Por exemplo, se um banco patrocina o clube de futebol do Estoril Praia, não podemos ter outro banco a patrocinar o Estoril Praia E-sports. Torna-se um pouco complicado, porque não são muitas as exigências que nós próprios fazemos, são mais as exigências derivadas das circunstâncias, que nos são feitas por parte do Estoril Praia para podermos aceitar uma parceria.

E o Estoril Praia tem facilitado o contacto com alguns dos seus parceiros e patrocinadores existentes, para que eles também patrocinem a secção de Esports?
Litrosa: É novamente importante relevar a diferença entre o Grupo Desportivo e a SAD Futebol. Qualquer modalidade do grupo desportivo está proibida de contactar os patrocinadores da SAD Futebol. Essa é a grande diferença que quero que as pessoas percebam. Por exemplo, um “coach” de League of Legends veio falar comigo porque pensa que é o Estoril Praia Futebol SAD que coordena da secção de esports… Não, é o grupo desportivo. Os rapazes do futsal que foram campeões nacionais também não têm qualquer tipo de vencimento. Isto é amor à camisola!

Esta realidade de patrocínios e dificuldades em conseguir apoios é algo que só se verifica no Estoril ou estende-se a todo este tipo de organizações?
Litrosa: Todo este género de organizações e associações sem fins lucrativos, que trabalham em torno de uma federação ou associação vão ter sempre este tipo de entraves.

Pegando neste conceito de “amor à camisola” quanto do vosso tempo é investido neste projeto de esports da vossa parte?
Soka: Eu durmo 4 horas por dia, trabalho 12 e mesmo no meu trabalho estou em contacto com o que se passa no Estoril Praia E-sports. Portanto, 85 a 90% do meu tempo é dedicado a este projeto.
Litrosa: No último mês no mínimo 4 a 6 horas por dia para tratar da equipa de LoL e todas as burocracias envolvidas.

Ao analisarmos as redes sociais do EPE reparámos que um dos primeiros anúncios foi com o objetivo de aquisição de streamers. Que importância veem no trabalho de um streamer?
Soka: Nós sabemos que o passar da palavra e o anunciar nas redes socias não é o suficiente para uma divulgação eficaz, pelo que os streamers e os youtubers são um meio fulcral para a divulgação do projeto e temos de apoiar estas pessoas que conseguem captar a atenção de outras. O nosso objetivo não é somente divulgar o EPE, mas também captar a atenção das pessoas e unir tanto streamers, como youtubers aos esports. Anteriormente, essas pessoas representavam-se apenas a elas próprias, mas agora já se veem associadas a clubes e organizações.

Que preocupações têm ao abordar um streamer para vos representar?
Soka: A nossa preocupação é que tanto o streamer como o youtuber não percam a sua personalidade, pois foi sendo eles próprios que conseguiram alcançar os seguidores e o público que têm e se mudarem há uma grande probabilidade de os perderem. Por isso, o objetivo é que continuem a ser quem são, mas a representarem o Estoril Praia E-sports.

Agora relativamente à equipa de League of Legends. Quão importante foi a entrada na Moche LPLOL para o projeto?
Litrosa: Para mim representou tudo, porque há alguns meses que o meu objetivo era criar uma equipa de raiz para entrar na Moche LPLOL e nós conseguimos.
Soka: Para mim também foi muito importante, porque esta equipa, apesar de algumas mudanças no plantel, já está connosco desde os Minotaurs on Steroids e foi extremamente gratificante finalmente conseguirem um objetivo que já era há tanto procurado por eles.

Na altura em que se apuraram para a Moche LPLOL qual foi a reação dos jogadores?
Litrosa: Foram dormir (risos). O mês dos Qualificadores foi muito violento; foram muitos jogos. Quando caímos na losers’ bracket foi muito desgastante, chegámos a reunirmo-nos desde o meio-dia até à 00.30 para analisarmos todas as equipas que iríamos defrontar e que estratégias adotar. No horário dos jogos quase não comemos nem bebemos enquanto esperávamos pelos confrontos; foi muito violento. Quando acabou o Qualificador estivemos uns 3 dias sem falar de LoL para recuperarmos as forças.

Como é que se desenvolve uma relação diária com os jogadores?
Litrosa: Falamos através de vários meios de comunicação e vamos discutindo assuntos do jogo. Na fase de preparação para os Qualificadores ligávamos uns aos outros e mesmo que nos odiássemos fazíamos o esforço, porque tínhamos de treinar e tínhamos um objetivo para cumprir e começámos a ser um pouco como uma pequena família. Eu sou um pouco como um pai, e de vez em quando tenho de impor ordem, mas são muitos meses juntos e cria-se sempre uma ligação.

Quais eram os objetivos ao entrarem na Moche LPLOL?
O que queríamos mesmo era melhorar. Sempre tivemos dificuldade em encontrar equipas melhores do que nós que quisessem jogar connosco; nunca nos levaram a sério e hoje em dia, felizmente, isso mudou um bocado. Começámos a crescer como equipa, mas sabemos muito bem que ainda temos muito a melhorar. Não diria que foi sorte entrarmos na Moche LPLOL, mas ao passarmos em 3º lugar do 2º Qualificador, temos noção que não era a situação ideal. Hoje em dia fazemos algumas scrims com equipas da Primeira Divisão, e percebemos que ainda há uma grande discrepância, que temos de aprender a jogar mais em equipa e ter menos a mentalidade de Solo Queue. Basicamente, estamos muito contentes em poder jogar contra equipas de topo e podermos aprender e melhorar como equipa.

A constituição da equipa está um pouco espalhada geograficamente, se conseguirem passar para a Primeira Divisão haverão alguns eventos ao vivo. Será fácil reunir a equipa tendo em conta que não há ainda muitos apoios?
Litrosa: Sim é bem possível. O support está em França, mas sempre disse que podia pagar a viagem e que tinha família em Lisboa e que aproveitava para os visitar. No caso do Lakus, ele também tem família em Lisboa, é só apanhar o comboio. O RLT está a estudar no Técnico. A nossa maior preocupação são os dois rapazes novos de 18 anos, que teriam mais dificuldade em conseguir fazer a viagem, mas daí também termos angariado algum dinheiro, não de patrocínios diretos, mas com a ajuda do Grupo Desportivo. Neste ponto estamos unidos como uma família, entreajudamo-nos e julgo que não há qualquer problema em reunir a equipa.

Voltando a um ponto mais abrangente, na vossa opinião qual é a perspetiva do desenvolvimento da área de esports no ecossistema português nos próximos tempos?
Soka: Para mim o fator principal para os esports se desenvolverem é a nossa comunidade ser mais unida e apoiarem mais as equipas. Haver menos competição entre as organizações, pois essa só deveria existir nos eventos entre as equipas, dentro do jogo. Um exemplo que posso dar é o do Ricardo Fox (jogador de CS: Go), quando foi representar os SK. A comunidade portuguesa fez comentários bastante negativos, no entanto depois da prestação esplêndida que teve colocaram-no num pedestal. Esta atitude está errada e temos de apoiar as equipas portuguesas e os jogadores, pois são nossos e mesmo quando não jogam tão bem, merecem o nosso apoio na mesma, porque são nossos. O facto de estarem constantemente a fazer comentários negativos e a denegrir a imagem das pessoas tem de acabar.
Litrosa: Concordo com o Soka. O que vejo é o que vejo em vários desportos, é esta competição muito agressiva e não entendo bem porquê quando o que todos queremos é que o cenário de esports seja mais visível em Portugal, e em vez disso estamos a lutar por ninharias em vez de nos juntarmos todos e criarmos bons eventos e boas relações entre organizações. No geral, em Portugal quando alguém tem sucesso em vez de darmos os parabéns e apoiar, começamos a dizer mal e a diminuir as capacidades da pessoa de ter conseguido algo, usamos muito a expressão “foi boosted” para justificarmos o facto de a outra pessoa ter conseguido e nós não. Temos de perder essa mentalidade muito “à portuguesa”. Não queria dizer isto porque sou português, mas é a verdade infelizmente. Tudo o que aconteceu na Espanha ou Alemanha não é um bom exemplo para nós? Porque é que continuamos aqui com esta atitude?

Pensando numa perspetiva mais organizacional, o que está a faltar a nível de estrutura e apoio, para que os esports se tornem mais visíveis e comuns e atraiam empresas que não estejam diretamente relacionadas com jogos e tecnologia?
Litrosa: Esse tipo de empresas aposta noutros desportos, porque têm uma estrutura de apoios que os tornam legítimos. Há uma associação ou federação que dita e faz cumprir um conjunto de regras. O porquê de não apoiarem uma equipa como a do Estoril deve-se precisamente a não percebem que como não há uma associação por trás dos desportos eletrónicos isto ainda é o faroeste e como pedimos a uma empresa para vir apoiar no faroeste? Enquanto isto não for oficializado e tiver regras que abranjam todo o cenário dos esports, isto não vai andar para a frente.
Soka: Eu concordo com o que o João disse. A mentalidade do português é muito comodista, pensa muito “eu não estou mal, então não me vou mexer para mudar”. Não há união das organizações, e se houvesse, muito provavelmente haveria mais divulgação do que são os esports, haveria um melhor conteúdo para que as pessoas percebessem este desporto e o que se pretende e de certeza que haveriam muitos mais clubes de futebol envolvidos. Somos um país pequeno e precisamos ser mais unidos.
Litrosa: Exato. Aqui em Portugal quando se chega ao topo, vai-se para fora. E para mudar isso temos de melhorar os esports portugueses.

Quais são os objetivos do EPE nos próximos dois anos?
Soka: Os nossos objetivos são de criar e dar estabilidade aos nossos jogadores e podermos proporcionar-lhes oportunidades de estarem mais vezes juntos, ir a eventos, etc. No fundo dar mais condições aos nossos jogadores para trabalharem. Nós podemos chegar ao topo, mas temos de ter noção que são os nossos jogadores que nos possibilitam estar lá e são eles que têm de ter condições em primeiro lugar e não nós.
Litrosa: Os objetivos acabam no fundo por ser melhorar as infraestruturas, pois uma vez que as equipas estejam a funcionar bem, terão cada vez mais prazer em jogar por nós e vamos ter resultados cada vez melhores. Nós nunca pensamos só em resultados, pois nisso já as equipas pensam por nós, mas sim em criar os pilares necessários para criar a estabilidade que elas necessitam.

Para terminar, qual seria o conselho que dariam para alguém que quer criar uma organização de esports?
Soka: Ninguém tem o direito de vos dizer que não podem continuar a sonhar.
Litrosa: Preparem-se para sacrificar muito tempo da vossa vida. Começa-se sempre por “amor à camisola” e vocês é que têm de querer. Sem determinação nunca vai resultar.

Foi sem dúvida uma conversa inspiradora que nos esclareceu sobre alguns aspetos de organizações associadas a clubes e os obstáculos enfrentam. Mesmo assim o EPE não desiste para poder dar aos seus jogadores a estrutura necessária para continuarem a representar o Estoril Praia e terem orgulho nisso. Ficámos a conhecer também a sua opinião sobre o futuro dos esports em Portugal e que na sua perspetiva, é preciso haver muito mais união para sermos uma comunidade mais forte e divulgarmos mais este desporto às restantes pessoas não diretamente envolvidas com o mesmo. Desejamos a melhor sorte a estes lutadores e se quiserem saber mais novidades visitem o Facebook ou o Site do Estoril Praia E-sports.


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